Brasil Interferência na Petrobras para impedir reajuste de diesel e gasolina deixa Estado à deriva

 


 




                                                         No centro do debate eleitoral e alvo de constantes trocas de comando, petroleira adia decisões estratégicas e transição energética


                                                 


A reunião do Conselho de Administração da Petrobras no dia 8 teve como foco o plano de negócios para os próximos cinco anos. Não funcionou. A reunião foi dominada pelo debate sobre a então possível saída de José Mauro Coelho da presidência da estatal e a pressão para evitar novos aumentos nos preços dos combustíveis.

É um exemplo de como a indefinição e as incertezas no comando ao longo do último ano e meio vêm impactando a petroleira. O gatilho veio em fevereiro de 2021, quando o preço do petróleo começou a subir em meio à retomada da economia global pós-pandemia, juntamente com o aumento da inflação. Como a Petrobras segue a paridade dos preços do petróleo no mercado internacional, os reajustes da gasolina e do diesel desagradaram o governo, resultando na renúncia de três presidentes da empresa até agora.

Enquanto o Conselho se prepara para uma nova reunião amanhã para avaliar a chegada de outro presidente, agora Caio Paes de Andrade, secretário de Desburocratização do Ministério da Economia, decisões estratégicas, principalmente as de médio e longo prazo, estão sendo adiadas pela Petrobras.

O freio na venda de ativos, investimentos e aprovação de ações estratégicas é visível.

“A liderança é consumida pela discussão dos preços dos combustíveis”, diz um executivo.




'Quem vai assinar?'

O planejamento para os próximos cinco anos deve ser traçado desde o primeiro trimestre. Ainda está de pé, aguardando a nova presidência e diretoria. Há executivos, entre os mais otimistas, já prevendo que o plano 2023/2027 só será divulgado em dezembro.

—Quem assinará documento importante? Ou autorizar a contratação de uma nova plataforma bilionária? Quem determinará o início do estudo de viabilidade do projeto? perguntou um executivo que prefere não ser identificado.

A paralisação, segundo outra fonte, impede a Petrobras de definir um plano de acesso a recursos essenciais para iniciar a licitação de plataformas e ampliar a produção. Há meses – com o debate sobre o risco de desabastecimento – gestores estatais discutem o papel do refino da empresa.

A questão é se a empresa vai continuar vendendo refinarias ou não. Os processos estariam parados desde a saída de Joaquim Silva e Luna, dizem profissionais da Petrobras. A estatal havia assinado um acordo para vender oito unidades, mas só se livrou de quatro.

O prazo para venda terminou no final de 2021, mas foi renegociado com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). A incerteza política, dizem fontes e analistas, dificulta as negociações, porque a estatal não teve interessados ​​ou recebeu propostas aquém do esperado. Decidiu-se, então, reinvestir em melhorias em unidades como a Rnest (PE), independentemente de atrair ou não novos interesses nas refinarias.

O impasse envolvendo o refino reflete o menor ritmo de venda de ativos. Em 2020, foram lançados no mercado 27 teasers com ativos de gás, campos de petróleo, parques eólicos e térmicas. No ano passado, esse número caiu para seis. Em 2022, até o momento, foram três, dos quais dois (o Campo Tartaruga e a Unidade de Fertilizantes Nitrogenados) foram relançados no mercado.




Sem plano de longo prazo

Entre 2019 e fevereiro deste ano, a Petrobras, segundo informações financeiras divulgadas pela estatal, já registrou em seu balanço a entrada de US$ 24 bilhões com a venda de ativos - US$ 5,6 bilhões desde o início de 2021 Em dezembro Por último, a estatal sinalizou ao mercado que venderia ativos entre US$ 15 bilhões e US$ 25 bilhões até 2026.  Na mesa estão sua participação na Braskem e a empresa detentora do gás Brasil-Bolívia encanamento. A venda da Transpetro permanece indefinida.

Dentro da petroleira, 2022 já é visto como um ano perdido.

O Plano Estratégico com visão de longo prazo também saiu de cena. A última foi feita em 2018, sob a gestão de Ivan Monteiro. Sem essa visão para os próximos dez anos, há indecisão em áreas-chave como a transição energética. As principais empresas petrolíferas do mundo estão investindo em energia renovável. O tema já havia sido alvo de debates internos entre diretores desde o início do ano, mas foi suspenso, pois o conselho deve mudar.

Carlos Augusto Junqueira, advogado especializado em Direito Societário e consultor sênior da FGV Projetos, destaca que as sucessivas interrupções no processo natural de substituição do responsável estão “salgando a terra”, prejudicando a estratégia de florescimento da empresa.

— A grande vítima dessa mudança antinatural é o Conselho, que não tem autorização. O natural seria que o Conselho decidisse mudar o presidente. Somente o Conselho pode ter a visão de longo prazo da empresa. Se não puder fazer isso, a empresa fica sem liderança.

Após a Operação Lava-Jato, o estatuto da Petrobras foi aprimorado e aprovada a Lei das Estatais, com o objetivo de resguardar a empresa de interferências políticas. Como resultado, as tentativas de mudar a política de preços por meio da substituição do presidente não surtiram efeito.

Luiz Carvalho, analista sênior de Petróleo e Gás do UBS BB, destaca que as mudanças na presidência da Petrobras vêm de longe. Mas essa repetida mudança de comando, no mínimo, retarda alguns avanços.

— No imaginário coletivo há uma leitura de que há um botão que o governo pode apertar para intervir na Petrobras e controlar os preços dos combustíveis. Devido a melhorias no estatuto e na Lei das Empresas Estatais, este botão tornou-se muito caro para pressionar. O dano político desse ato é muito grande — pondera, que acredita que mudar a Lei das Estatais seria um “revés”.

A partir de 2016, diz ele, houve uma grande melhora na governança e na rentabilidade. A Petrobras se tornou uma das empresas mais rentáveis ​​do mundo, atingindo R$ 44,56 bilhões em lucro líquido no primeiro trimestre, mais de 38 vezes o valor registrado no mesmo período de 2021.

— Mesmo que o petróleo caísse para US$ 30, não teria problema de caixa — diz Carvalho. — Qualquer manutenção do que foi feito dará bons frutos. A principal linha de atuação se mantém desde a gestão de Pedro Parente (no governo Temer), com disciplina financeira, realizando desinvestimentos, seguindo a paridade de preços no mercado internacional.

A desvantagem é que a Petrobras tem uma avaliação “extremamente descontada”, em comparação com as grandes petrolíferas globais.

— O mercado atribui um risco de intervenção. Isso polui a percepção do investidor. O risco de mudança de rumo levanta dúvidas sobre qual direção a empresa seguirá — diz o analista.

O mais descontado

Um parâmetro que aponta a Petrobras como a petroleira mais barata do mundo, segundo relatório da XP, é o múltiplo que resulta da relação entre o valor da empresa (EV) e o Ebitda (indicador de caixa). A Petrobras está em 1,7, bem abaixo de concorrentes como Chevron (4,9x), Exxon Mobil (4,7x) e Shell (3,2x).

Dentro da empresa, os funcionários estão assustados, relata uma fonte. E já há profissionais querendo sair da empresa. O temor é que uma eventual interferência na política de preços abra caminho para, posteriormente, mudanças na gestão e, posteriormente, no caixa. - Se você colocar pessoas sem qualificação, fica claro que existe um processo decisório que não tem nada a ver com uma empresa com boa governança - diz essa fonte.

Marcelo de Assis, diretor de pesquisa upstream para a América Latina da Wood Mackenzie, destaca as preocupações em torno do governo e do Congresso sinalizando que a Lei das Estatais pode ser alterada para permitir maior interferência na estatal:

— Esse tipo de interferência pode afetar novamente a capacidade de investimento da empresa. Se houver subsídios pesados ​​com combustível, pode aumentar a dívida da empresa novamente e impactar o caixa, o que traria mais problemas para a Petrobras. É o tipo de intervenção eleitoral e não resolve o problema do combustível.

caminho incerto

Mudanças no estatuto, por outro lado, desencadeiam crises, a começar pela demissão de Pedro Parente em meio à greve dos caminhoneiros em 2018. De janeiro de 2021 a junho deste ano, o valor da gasolina nas refinarias subiu 121% e o do diesel , 177%, refletindo a abertura da economia após os bloqueios na pandemia e na guerra. Petrobras faz ajustes de paridade com os preços internacionais.

— A gestão fragmentada impacta principalmente na estratégia de médio e longo prazo. O pré-sal está cada vez mais maduro e não houve descobertas significativas nos últimos cinco anos. Qual é a estratégia futura, já que tem vendido ativos em gás, energia e renováveis ​​nos últimos anos? Quais serão os investimentos? É o caminho? pergunta Assis.

O temor hoje é que a empresa corte os investimentos. A estatal, com base em seu plano de negócios de cinco anos, vem pisando no freio. Em 2019, a meta era investir US$ 75,7 bilhões entre 2020 e 2024. Em 2021, o número caiu para US$ 68 bilhões entre 2022 e 2026. Esses dados refletem a tímida projeção de crescimento da produção de petróleo. A expectativa é passar de cerca de 2,6 milhões de barris de óleo equivalente por dia (boe/d) neste ano para 3,2 bilhões de boe em 2022.

Esse menor apetite para investir ocorre com um nível recorde de preços do petróleo. Só neste mês, o barril chegou a US$ 130. Para analistas, a estatal pode ter produção maior, aproveitando o bom momento do mercado. A produção, no entanto, caiu de 2,770 milhões de barris de óleo equivalente por dia (boe/dia) para 2,462 milhões de barris, na média do primeiro trimestre deste ano.


Empresas estatais brasileiras   Governo  Petrobras


imagens de fontes google

redação da fonte https://exame.com/brasil/interferencia-na-petrobras-para-frear-reajuste-de-diesel-e-gasolina-deixa-estatal-a-deriva/

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